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“A IA está criando uma nova mentalidade para lidarmos com o conhecimento”

Paolo Granata, Professor da Universidade de Toronto, compartilha sua visão e estudos em relação ao papel da inteligência artificial na educação 

 

“É necessário conhecimento para gerar novo conhecimento.” Este é um dos pilares do trabalho de Paolo Granata, Professor da Universidade de Toronto e Diretor do Media Ethics Lab (Laboratório de Ética da Mídia). Ele lecionou o curso “AI Literacy and Generative Knowledge” (Alfabetização em IA e Conhecimento Generativo) entre os dias 19 e 30 de maio na ESPM, autoridade em Marketing e Inovação voltada para negócios. A vinda dele foi uma iniciativa da área de Internacionalização da instituição. 

 

Ao longo das aulas, Granata apresentou aos estudantes os fundamentos da inteligência artificial, explorou suas diversas aplicações e o impacto dessa tecnologia na cultura e na mídia. O docente também trabalhou com o conceito de conhecimento generativo, principalmente no contexto da educação.  

 

Para ele, a IA deve ser vista como uma aliada e não uma substituta no processo de aprendizado. “Não podemos dizer que há um meio-termo ou que depende de como você usa esta ferramenta. Na verdade, não depende de como usamos. Ela está aqui. Não podemos evitar. Não podemos deixar de ensinar os alunos a usá-la”, explicou. 

 

Em entrevista ao Blog ESPM, Granata falou do futuro da educação, como a academia está acompanhando as constantes mudanças tecnológicas, o conceito de conhecimento generativo, e a importância do contexto no uso da inteligência artificial. Confira: 

 

Durante a sua primeira palestra, você falou sobre como a IA se tornou muito popular depois da OpenAI, e a rapidez com que isso aconteceu. Estamos vivendo um momento em que grandes mudanças acontecem o tempo todo. Como a academia está acompanhando isso?

 

A palavra-chave para entender o que está acontecendo, e como lidar com essa revolução, é adaptação, que significa ir além das certezas. Como professores, temos educado por anos da mesma maneira. Sempre brinco que as instituições acadêmicas geralmente são muito conservadoras; precisamos conservar esse papel institucional para preservar o conhecimento. No entanto, este é um momento em que temos que nos adaptar à mudança, o que exige um esforço colaborativo, envolvendo tanto professores quanto alunos. Devemos abraçar essa transformação para entendermos criticamente como lidar com ela e, claro, aproveitar as possibilidades dessa revolução da IA para repensar a maneira como aprendemos e criamos. 

 

Antes, você podia escrever um artigo acadêmico e trabalhar em um mesmo assunto por muitos anos, e as coisas permaneciam as mesmas, ou praticamente as mesmas. Como estamos acompanhando tantas transformações da IA em tempo real em termos de pesquisa?

 

Nas últimas décadas, as instituições acadêmicas dedicaram muita atenção à criação de conteúdo, ao produto final — artigos de pesquisa ou qualquer outro tipo de resultado intelectual. Essa era a maneira de avaliar os alunos e ensiná-los a realizar uma determinada tarefa. Mas, graças a essas ferramentas de IA generativa, o conteúdo pode ser gerado com facilidade e, o produto, disponibilizado rapidamente.  

 

Agora, é hora de focarmos no intermediário: o processo de aprendizagem e criação. O processo intelectual, o contexto, está se tornando mais importante do que o produto final. E aqui, contexto significa pedagogia: o tipo de ambiente de aprendizado que o professor é capaz de criar. Como instituição acadêmica, devemos nos focar em como criar a melhor experiência de aprendizado para os nossos estudantes. 

 

Às vezes, eles precisam contextualizar o que aprendem. Talvez o professor, além de fornecer conteúdo, seja capaz de contextualizá-lo, criando uma rede de conhecimento que proporcione uma forma mais profunda de entendimento. Isso está afetando a maneira como os estudantes aprendem porque, em vez de focar no conteúdo, podem focar nas conexões entre as disciplinas. Esse tipo de aprendizado contextual é uma oportunidade valiosa, pois, quando o conteúdo é facilmente gerado, o que realmente faz a diferença é o contexto. 

 

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Estudantes da ESPM participaram do curso do Professor Paolo Granata de forma presencial e online. Foto: Reprodução/Linkedin

 

Ainda há uma reação negativa em relação ao uso da IA na educação. Há muitos casos de alunos usando a IA em trabalhos e de professores que estão tendo dificuldade com isso. O que precisamos fazer para mudar essa mentalidade?

 

Ainda existe um estigma no uso da IA na educação em geral. É fácil culpar os alunos por trapacearem, mas isso é, em certa medida, nossa culpa. Porque se os alunos forem avaliados em relação ao produto final, é claro que pegarão um atalho. Não podemos culpá-los neste momento porque estamos todos aprendendo. E é absolutamente normal pegar um atalho para melhorar a eficiência, a produtividade e assim por diante. 

 

Então, antes de tudo, precisamos ir além desse estigma: se usarmos a inteligência artificial para detectar câncer em uma mamografia, e assim podermos, literalmente, salvar vidas, tudo bem usar a IA, certo? Por que não seguimos o mesmo raciocínio sobre o uso da IA para fazer pesquisas em um campo diferente, como o acadêmico, por exemplo? 

 

Muitos estudos foram realizados nos últimos dois anos, desde o advento do ChatGPT e da IA generativa, em relação à educação. Há pesquisas que dizem que o uso da IA na educação está afetando negativamente o desempenho dos alunos, que eles estão se tornando mais preguiçosos ou desenvolvendo uma super dependência dessas ferramentas. Mas também há outros estudos que dizem o contrário, que abraçar a IA na educação pode melhorar o desempenho e o pensamento crítico, além de criar novas habilidades que estão surgindo. Não podemos dizer que há um meio termo ou que depende de como você usa esta ferramenta. Na verdade, não depende de como usamos. Ela está aqui. Não podemos evitar. Não podemos deixar de ensinar os alunos a usá-la. 

 

Então, no geral, você é otimista em relação ao futuro da inteligência artificial na educação?

 

Sou otimista, mas com base na história. Afinal, qualquer nova tecnologia ou mídia, quando corretamente integrada, trouxe benefícios à educação. Após a Revolução Industrial, as pessoas puderam se alfabetizar, criando uma sociedade mais consciente e trazendo outros benefícios em resposta a esse tipo de, não apenas revolução industrial, mas eu diria uma revolução do conhecimento.  

 

Qualquer nova tecnologia trouxe uma revolução do conhecimento. Temos evidências de que, talvez no curto prazo, haja incertezas. É por isso que é urgente lidar com o que está acontecendo, e pensando que há possibilidades, potencial e benefícios ao longo do caminho, mas cabe a nós realmente determinarmos o futuro que queremos. O futuro ainda não está escrito, certo?  

 

Agora é o momento em que os educadores podem, realmente, projetar o futuro do aprendizado que querem para os estudantes. E esta é uma escolha. É uma responsabilidade. E isso exige novas habilidades e conhecimentos, adaptação às mudanças para moldar o futuro que queremos ver para nossos alunos.  

 

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Paolo Granata, Professor da Universidade de Toronto, deu curso sobre alfabetização em IA e conhecimento generativo na ESPM. Foto: Acervo pessoal

 

Você mencionou a revolução do conhecimento. Qual seria o nome da época que estamos vivendo agora?

 

Eu me baseio no grande filósofo canadense Marshall McLuhan, o fundador dos estudos de mídia e tecnologia e dos estudos culturais. Ele, depois de analisar a era moderna, disse que estamos vivendo na Galáxia de Gutenberg, em referência ao inventor da imprensa no mundo ocidental. Pois os livros impressos foram a principal interface para o conhecimento da era moderna. 

 

Hoje, se quisermos encontrar outro ícone, podemos escolher Alan Turing, o matemático britânico que é considerado o pai fundador da inteligência artificial. Entramos na Galáxia de Turing, onde a IA não é apenas uma ferramenta, produto ou serviço. A inteligência artificial é um ambiente no qual vivemos. Ela está criando uma nova mentalidade, uma nova atitude para lidarmos com o conhecimento. A própria inteligência artificial não está substituindo os livros ou as formas canônicas de aprendizado, mas, sim, fornecendo uma nova interface para o conhecimento. A inteligência artificial é, na verdade, um artifício da inteligência.

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Foto de Isabela Moreira
Isabela Moreira
Repórter do Núcleo de Conteúdo da ESPM
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